Tanta dor, tanta amargura,
A sulcar faces tão belas
E tanta água que é pura
A lavar sujas vielas.
(Armando Goes)
Encontro marcado às 14:30h 6 de Junho
na Praça de Londres.
Foi agradável conhecer os Colegas
de luta de outros pontos do País. Senti a força que unia todos e por mais
estranho que pareça, eram como Amigos de longa data. Cheguei a pensar que
alguns eram ainda mais Amigos que outros que tenho mais antigos…
Descobri que a força da luta nos
torna fortes, unidos nos mesmos objectivos, desligados de ninharias e factos
fúteis. Eu sabia isso, mas ali tudo se revestia de uma intensidade muito maior.
Enquanto se gritavam palavras de
ordem que se ouviam no 17º andar do Ministério da Solidariedade e Segurança
Social (?) eu pensava na minha vida.
Foi sempre uma vida feita de
lutas, de persistência, de querer saber, saber estar, de teimar até alcançar o
objectivo, de ensinar aos mais jovens o meu saber, ajudá-los a crescer, enxugar
algumas vezes as suas lágrimas pelos reveses das suas vidas.
E lutei para fazer do meu filho
um Homem, luta que se tornou mais difícil quando o meu marido ficou
desempregado pela falência da Empresa. Uma reforma forçada por ser velho para
trabalhar, novo para se reformar o que implicou penalização.
Mesmo assim nunca dei um passo maior
que a perna. A minha casa está paga, o carro também, o filho licenciou-se numa
boa Universidade privada, faz actualmente uma especialização.
Mesmo no fim da minha vida de 44
anos de trabalho, tive uma luta com a minha entidade patronal, para que me
fosse feita justiça, para não perder o que já alcançara. Ganhei a luta, perdi
saúde.
Pensei na minha mãe que, com
pouco mais de 600 euros de pensão de sobrevivência, vai ter que pagar quase 250
de IRS. Pensei no orgulho dela, cuja vida foi muito mais difícil que a minha
porque aos 8 anos ficou sem mãe e três irmãs mais novas para cuidar. Orgulho
que não permite que eu lhe pague a máquina de lavar que lhe comprei para
substituir a que se avariou. Não nos quer sobrecarregar nem a mim nem ao meu
irmão.
E enquanto as palavras de ordem,
os cantos se repetiam, a cabeça continuava a pensar. Deixei as minhas lutas e
comecei a pensar em todos aqueles que estão piores que eu. Há sempre alguém
pior que nós.
Pensei em quem ainda tem menos e
nas crianças com fome que desfalecem na escola. Pensei que quando vou a Lisboa
de comboio há pessoas a viver debaixo das pontes…
Que Mundo é este meu Deus que
deixa crianças com fome? E pensei nas mães dessas crianças e achei que eu seria
capaz de roubar para dar de comer ao meu filho.
Que sentiria vergonha ter que ir
a uma instituição pedir comida, roupas… Pensei mesmo que não iria… E lembrei-me
dos suicídios que estão sempre a acontecer mas que os jornais nem referem.
Pensei no desespero que algumas famílias
estão a passar e as leva ao suicídio colectivo.
E aí chegou a raiva. A raiva por
saber todo o sofrimento de quem vê os seus filhos partir para bem longe na
procura de algo melhor. Afastei o pensamento porque não consigo imaginar a dor.
Mas a raiva aumentava e eu, que quando
choro o faço sozinha, não me contive e chorei lágrimas de ódio por tudo o que
nos estão a fazer, sem pensar que o fazia à frente de centenas de pessoas. Estão
a destruir o meu Portugal, a matar os idosos de dor, solidão e doença enquanto
os verdadeiros responsáveis estão ao Sol, perfeitamente em Paz com a sua suja
consciência.
Disfarçam a sua incompetência com
a chuva e curvam a coluna perante a Alemanha e a Troika vendendo aos bocados o
País onde nasci lindo de cima abaixo, com pessoas excepcionais que mandam sair
do seu conforto.
E a raiva cresceu tanto como a
certeza de que estou do lado da razão que as lágrimas caíram cheias de revolta
mas com uma força e pronta para uma luta que eu nunca julguei ser capaz de
fazer!